À revelia do Conselho de Segurança da ONU, os Estados Unidos vão instalar sistemas antimísseis em quatro países árabes do Golfo Pérsico — além de reforçar o chamado “patrulhamento” da costa iraniana por navios também interceptores de mísseis. Segundo fontes não-identificadas da Casa Branca e do Pentágono, a ofensiva estadunidense visa a acelerar “um dispositivo militar de dissuasão e cerco”.
O comandante americano no Golfo, general David Petraeus, confirmou recentemente o envio de oito baterias de mísseis Patriot para “quatro países árabes” — Qatar, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Kuwait. Os Patriot são eficazes contra mísseis de curto alcance. Foi agora acrescentado o envio de navios equipados com o sistema de combate Aegis, que combina radares e sistemas de intercepção capazes de neutralizar mísseis de médio alcance.
A Arábia Saudita já dispõe de antimísseis e, tal como os Emirados Árabes Unidos, está modernizando aceleradamente as suas capacidades militares, designadamente a aviação. Já os Estados Unidos têm em mente a criação de uma força árabe com poder de ameaça e cerco armado. Tudo para ameaçar a soberania do país presidido por Mahmud Ahmadinejad.
Desestabilização
Trata-se da concretização de uma das mais ousadas investidas estadunidense desde a posse, há pouco mais de um ano, do presidente Barack Obama. A notícia dos novos escudos, publicada no último domingo (31/1) pelos jornais The New York Times e Washington Post, não chega a surpreender, uma vez que o uso de antimísseis já havia sido insinuado no discurso de Obama sobre “o estado da União”.
Há meses, os Estados Unidos vinham desenvolvendo sua nova política bélica, alegando a recusa iraniana de ter “mão estendida” para um “diálogo”. É preciso considerar, no entanto, que os termos dessa eventual negociação foram todos impostos pelos Estados Unidos. Na sexta-feira mesmo, o Departamento de Estado acusou as falsas premissas do tal “diálogo”, ao dizer, por meio de um porta-voz, que “a oferta está aí para que o Irã diga sim”.
Já a secretária de Estado Hillary Clinton, em pronunciamento alarmista, agregou recentemente que as “ambições nucleares” do Irã “ameaçam o restante do mundo”. Além disso, o Senado norte-americano aprovou um projeto que autoriza Obama a aumentar as sanções contra Teerã e retalia empresas que fornecem gasolina ao país.
A ingerência não fica restrita aos Estados Unidos. O Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA) apresentou uma proposta inaceitável — e prontamente recusada — para dilapidar a soberania iraniana. Segundo a proposta, o Irã passaria a enriquecer fora de seu território, principalmente na Rússia, parte do urânio produzido no país — e o material seria devolvido já como combustível, para alimentar um reator médico que fabrica isótopos para o diagnóstico e tratamento de câncer.
O Irã se recusa sequer a dar uma resposta formal ao convite de falso “diálogo” da comunidade internacional. O país enfatiza que tem um programa nuclear civil com fins pacíficos, a despeito do que acusam Washington e Bruxelas. Está claro que a atual ação estadunidense dá curso à campanha de desestabilização do Irã e de Mahmud Ahmadinejad.
Paralelamente à instalação dos escudos antimísseis, preparam-se novas sanções — medida que não tem consenso na comunidade internacional, nem sequer no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Diante da resistência da Rússia e da oposição aberta da China, a via da ONU está praticamente fechada. E também as sanções unilaterais das potências ocidentais não são ainda claras — o que deslegitima o discurso da Casa Branca.
A posição do Brasil
É em meio a esse impasse que sobressai a posição brasileira. Na quinta-feira passada, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, o ministro de Relações Exteriores brasileiro, Celso Amorim, conversou com o chanceler iraniano, Manouchehr Mottaki, em um esforço diplomático para reiniciar o diálogo sobre o programa nuclear de Teerã.
Diferentemente dos Estados Unidos e de seus aliados europeus — que radicalizam o discurso por sanções mais duras da ONU contra Teerã —, o Itamaraty investe num diálogo que respeite a soberania iraniana. Segundo Celso Amorim, o Brasil não quer atuar como mediador na polêmica, mas “respeita o direito do Irã de ter seu programa nuclear para fins pacíficos”.
Com agências internacionais