Apesar dos esforços do presidente Porfirio Lobo para apresentar ao mundo uma Honduras perto da normalização e da reconciliação, os resultados de cinco meses de seu governo mostram um país que continua mergulhado em uma grave crise política, econômica e social. A nação caribenha não consegue se livrar dos efeitos do golpe de Estado de 28 de junho de 2009, que completou um ano na última segunda-feira.
De acordo com uma análise realizada em maio por mais de cem organizações da sociedade civil hondurenha, Porfirio Lobo assumiu a presidência em janeiro em meio ao isolamento internacional e à falta de legitimidade — "produtos de um processo eleitoral não transparente" e de uma ruptura institucional não resolvida. Seu governo ainda não demonstrou "uma vontade política de promover mudanças e transformações rumo à construção de um estado de direito", dizem as entidades.
Embora conte com maioria absoluta no Congresso Nacional, Lobo manteve intactos os poderes do Estado que participaram ativamente do golpe. O novo presidente "reafirmou o poder real das forças armadas", entregando a militares instituições-chave como "as telecomunicações, a aviação civil, a marinha mercante e o controle de imigração e estrangeiros", explica o relatório.
Recentemente, o governo aprovou um novo pacote de impostos que afeta principalmente os setores mais necessitados. "A fim de compensar os gastos do golpe, está promovendo a terceirização nas relações de trabalho, Lobo congelou o salário mínimo e implementou medidas antissindicais", acusou Carlos Reyes, líder da Frente Nacional de Resistência Popular, grupo que se opôs ao golpe.
Ambiguidade
Seu governo também foi caracterizado por um discurso ambíguo em relação ao processo de reconciliação no país. Se, por um lado, o presidente buscou o reconhecimento internacional e a reativação dos fluxos de capital provenientes da cooperação externa, apresentando um país reconciliado e pacificado, por outro ele "negou-se a reconhecer o papel político e social da Resistência".
Lobo aprovou um “Plano de Nação e de Visão de País” que privilegia uma economia de enclave, baseada na regionalização, "sem nenhuma consulta à população e suas aspirações de mudança". Desse modo, priorizou os investimentos nacionais e transnacionais nos territórios, "aprofundando as assimetrias e desigualdades territoriais já existentes", sem tratar seriamente de "problemas centrais como a pobreza, a falta de segurança e o desemprego", denunciam as organizações da sociedade civil.
Segundo o atual chanceler hondurenho, Mario Canahuati, o governo de Lobo já foi reconhecido por mais de 80 dos 192 países que fazem parte da ONU. No entanto, a imensa maioria dos países latino-americanos se recusa, impedindo a reinserção de Honduras em instâncias regionais como a OEA (Organização dos Estados Americanos) e o Sica (Sistema de Integração Centro-Americano). A persistente violação dos direitos humanos e a condição de exilado do presidente deposto Manuel Zelaya contribuíram de forma decisiva para essa situação.
De acordo com o Comitê de Familiares de Presos Desaparecidos em Honduras, mais de 700 violações dos direitos humanos — entre elas 12 assassinatos — ocorreram durante o governo de Porfirio Lobo. Essa grave situação "continua pesando como espada de Dâmocles" sobre o atual governo – em referência à parábola grega sobre o risco iminente. É por isso que o presidente Lobo "aparece sozinho, desprovido de poder, na encruzilhada de setores populares em mobilização, que dele exigem mudanças, transformações e um novo pacto social", afirma o documento.
"Honduras precisa urgentemente de uma solução política, de uma refundação. Só com um novo pacto econômico, político, social, com uma nova constituição, teremos as armas para a transformação econômica e social do país", concluiu Carlos Reyes.
Falência
Um ano depois do golpe que derrubou o presidente Manuel Zelaya, Honduras caminha para piorar sua própria falência. No final de 2009, a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) disse em seu relatório anual que a crise política de Honduras "ampliou os efeitos da recessão global no país" e que o golpe teve um grave impacto sobre a economia, "já altamente dependente da ajuda externa".
Os dados da Cepal revelaram um encolhimento do PIB em 3%, enquanto o Banco Central de Honduras anunciou que a suspensão do fluxo de financiamento por parte do Grupo de Países e Organismos Cooperantes (G-16) provocou uma queda de 40% nas entradas de capital.
Diante da queda da renda e da impossibilidade de se obter financiamento externo, "o déficit fiscal chegou a 4,5% do PIB e foi coberto com um aumento de 80% do endividamento público", afirmou a Cepal. Além disso, o governo de facto de Roberto Micheletti aumentou drasticamente os gastos militares, o que provocou uma queda adicional do PIB.
De acordo com estudo realizado por Wilfredo Girón Castillo, professor de economia centro-americana, o golpe provocou o fechamento de 60% dos estabelecimentos comerciais e empresas produtivas do país por mais de duas semanas, o que resultou em um prejuízo de 52,6 milhões de dólares. As manifestações da população nas ruas, o fechamento de fronteiras e a suspensão das remessas de organismos internacionais teriam provocado perdas estimadas em mais de 3,45 bilhões de dólares.
"O Índice Mensal de Atividade Econômica registrou uma queda drástica de mais de 3% em todos os meses posteriores ao golpe. Os setores mais afetados foram a construção e o comércio, com um recuo de 13% e 8,9%, respectivamente", afirmou Girón. "Podemos afirmar que a vitória obtida pelos grupos de poder foi uma vitória de Pirro e que todos nós perdemos", disse o economista.
Sem retomada
Cinco meses depois da posse de Porfirio Lobo, a situação não melhorou muito e ainda não há sinais de uma verdadeira retomada da cooperação internacional. "As eleições e o reconhecimento do novo governo por parte de alguns países trouxeram mais tranquilidade a Honduras" e isto permitiu uma lenta reativação econômica. "No entanto, é preciso saber interpretar o aumento do índice", afirmou Girón.
Segundo o economista, os setores que mais cresceram foram o bancário, o de seguros e o de telecomunicações, ou seja, "os setores de acúmulo de capital especulativo nas mãos dos grupos de poder". Já os setores que geram emprego, como a construção, o comércio e a agricultura, "continuam afundados na crise e, desta recuperação econômica, pouco sobra para a população".
Da Redação, com informações do Opera Mundi