Socorro Gomes: Colômbia busca união para superar conflitos

A presidente do Conselho Mundial da Paz (CMP) e integrante do grupo Mulheres pela Paz, Socorro Gomes, participou ativamente do processo que permitiu a libertação dos últimos militares sequestrados pelas Farc. Nesta sexta-feira (6) a pacifista retornou da Colômbia e concedeu entrevista exclusiva ao Vermelho. Ela conta que, após o processo no país colombiano, deverá viajar para a Síria para uma missão de solidariedade do CMP com aquele país.

Na última segunda-feira (2), as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) libertaram unilateralmente os últimos dez militares em seu poder. O processo teve início após uma troca de cartas entre as Mulheres pela Paz e a insurgência, como conta Socorro e teve o apoio do governo brasileiro e da Cruz Vermelha. Para a ativista, apesar das ações da guerrilha, o governo colombiano, comandado por Juan Manuel Santos, não está disposto ao diálogo, tampouco a permitir uma saída política para o conflito.

Vermelho: O que a população está achando de todo esse processo?
Socorro Gomes: A população está esgotada do conflito armado. Não aguenta mais e quer a paz. Tem muitas mortes, muitos assassinatos, um paramilitarismo fortíssimo. Um crime organizado muito forte, que envolve autoridades do Estado. Personalidades do governo [do ex-presidente Álvaro] Uribe estavam envolvidas em grande número [com ligações do narcotráfico]. Como a população está determinada à Paz, [o governo] está obstruindo, pressionando.

Vermelho: E quanto ao fato de o governo não ter permitido que as Mulheres pela Paz visitassem as prisões onde estão os prisioneiros das guerrilhas? O governo, na verdade, sustenta que não existem presos de guerra ou políticos no país…
SG: Esse gesto da insurgência foi muito importante perante a sociedade. Primeiro porque eles prometeram e cumpriram. Isso é significativo. Demonstra a vontade de dialogar, buscar caminho pela paz. Faltou o governo cumprir o prometido e permitir a visita aos presos políticos e prisioneiros de guerra. O governo tenta esconder o sol com a peneira. Ele tenta dizer que não há presos políticos. O mundo inteiro sabe que a Colômbia vive há 50 anos um conflito armado e que tem presos desse conflito. Evidentemente são presos políticos e de guerra. E o prometido não foi cumprido. A sociedade colombiana está buscando abrir mais um caminho da paz. Estão construindo o movimento Marcha Patriótica, que será realizado de 21 a 23 de abril com pessoas de diversas partes do mundo.

Vermelho: O que pretende esse movimento Marcha Patriótica?
SG: Os colombianos estão buscando unidade na Colômbia. [Estão se organizando] para dizerem o que querem. O eixo dessa marcha patriótica é a luta contra o desalojamento dos trabalhadores de suas terras para grandes empresas terem seus negócios. [Funciona assim:] os paramilitares expulsam, aterrorizam, assassinam [camponeses] e depois vem a empresa. Então é: um trabalha para o outro. Esse é um dos pontos. O outro é a questão do diálogo. Eles estão buscando reunir uma grande unidade. A juventude está muito envolvida. Tem muitos jovens que cresceram nesse ambiente de guerra, de desaparecimento de jovens, com cemitérios clandestinos. Então os jovens se envolveram muito nesse processo da paz, da luta política.

Vermelho: Enquanto as Farc sinalizam abertura para o diálogo, Santos intensifica os ataques à insurgência. Em menos de um mês, morreram mais de 60 guerrilheiros…
SG: O que fica claro é que o governo não quer dialogar, não quer a saída política, a saída pela paz, pela negociação. Eles querem continuar nessa via militarista de mais morte, mais violência e isso é muito mal. A nós, o que nos cabe? A solidariedade ao povo colombiano. Por uma questão humanitária, por uma questão de compromisso com o nosso continente e porque essas ameaças, essa violência nos afeta, nos ameaça. Eu creio que o caminho não é fácil.

Agora penso que os fóruns da região Celac, Unasul, Mercosul, devem discutir esse tema. Porque os problemas internos da Colômbia são resolvidos pelo povo colombiano de forma soberana, e eles estão preparados para isso. Agora o conflito, as ofensivas militares, são ameaças a todos os vizinhos. À paz e à nossa segurança. Temos bases estadunidenses ao nosso redor. Isso é um problema de toda a região e deve ser tratado como tal. Porque para a América Latina se integrar, desenvolver de maneira progressista, é preciso que consolidemos nosso continente como um continente de paz, com uma integração distinta.

Vermelho: Soube que irá à Síria..
SG: Sim. Na última reunião, o Comitê do Conselho Mundial pela Paz decidiu realizar uma visita de solidariedade à Síria. Essa missão será realizada de 21 a 26 de abril.

Vermelho: E qual é o objetivo dessa missão?
SG: Prestar solidariedade ao povo sírio, fazer a denúncia de que o direito internacional está sendo violado por potências imperialistas, que a Otan, os EUA, a União Europeia e países da Liga Árabe, como a Turquia, o Catar, os Emirados [Árabes] estão a atentar contra a soberania síria, contra os princípios da própria Nações Unidas. A Senhora Hillary Clinton esteve na região chamando esses países a intensificarem os ataques contra a Síria, dizendo que era preciso armar a oposição… Já mataram milhares de civis. Inclusive de representantes do governo. Para nós é um crime e uma violação do direito internacional que deixa o mundo inteiro à mercê da lei do mais forte.

Mesmo porque cabe ao povo sírio construir a sua vida, resolver os seus problemas. Sem intervenção de agentes estrangeiros e infiltrações. Inclusive [eles enviam] carregamentos de caminhões com armas para desestabilizar e derrubar o governo. É um crime que não podemos aceitar. É um crime que pode ferir de morte a Organização das Nações Unidas porque se a ONU permitir, isso nos deixa a todos os países que não comungam, que não se submetem à vontade das potências imperialistas, ameaçados e inseguros.

Vermelho: Quem são os interessados nessa ofensiva contra a Síria e o que querem?
SG: Os governos imperialistas dos Estados Unidos e da Europa. Eles querem ali um Oriente Médio submetido às suas vontades. Querem ali o que querem sempre. Saquear petróleo, recursos naturais e controlar a região. Por isso querem derrubar os governos que não se submetem. É necessário que as organizações pacifistas, as organizações políticas, progressistas, os povos do mundo denunciem esses crimes. Assim foi com a Síria, assim foi com a Líbia e daqui a pouco é o Irã e foi assim antes com o Iraque e o Afeganistão. A Líbia está toda dividida, cheia de disputas tribais, de grupos de criminosos assassinando os presos, sequestrando. E agora partem para cima da Síria.

O que eles querem mesmo não é nenhum compromisso com a democracia, ou com os direitos humanos. É que utilizam as palavras de maneira torpe. Democracia para eles é destruir um governo eleito. Democracia para eles é assassinar civis, levar armas para grupos criminosos para poder destruir esse governo. Progresso para eles é saquear riquezas para ficar nas mãos de suas empresas. É completamente o oposto do que significa essas palavras. Soberania não existe. É a soberania do negócio, soberania imperial, não a dos povos. Essa eles não respeitam

Fonte: Vermelho 

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