Ahmed Sbaai, um dos saaráuis do “grupo de Gdeim Izik” presos pelo Marrocos, denunciou maus-tratos em apelo divulgado nesta segunda-feira (18). Sbaai é membro do Conselho de Coordenação da Associação Saaráui de Vítimas de Graves Violações de Direitos Humanos Cometidas pelo Estado Marroquino. Os prisioneiros denunciam torturas e outros maus-tratos desde o julgamento falsário que determinou inclusive a prisão perpétua a alguns dos participantes do grande acampamento de protesto de 2010 contra a ocupação marroquina do Saara Ocidental. Diversos parlamentares, organizações e entidades populares apelam pelo acompanhamento da situação dos prisioneiros. Leia o testemunho de Sbaai.
“O prisioneiro está privado de liberdade, não de dignidade”
Testemunho do defensor de direitos humanos e prisioneiro político saaráui Ahmed Sbaai (Grupo Gdeim Izik) sobre os dez dias passados nos banheiros da prisão central de Kenitra.
Enquanto o mundo se preparava para comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos, o Estado marroquino também o celebrou, mas à sua maneira.
Foi assim que, em 4 de dezembro de 2017, fui arrastado para um pequeno banheiro, assim como o meu companheiro do mesmo grupo, Sidi Abdallahi Abbahah, que também foi atirado a outro banheiro, não muito longe de mim. O lugar é um espaço muito pequeno com odores nauseabundos, insetos pequenos que aparecem à noite e uma pequena janela que permite a entrada do frio durante a noite. Estes banheiros estão no segundo andar, chamado “Bairro do Arrependimento”.
Todos os prisioneiros são deliquentes comuns, que gritam dia e noite, batem nas portas e cheiram fumaça de cigarro. A isso deve-se acrescentar que as lâmpadas ficam acesas toda a noite. A comida estava suja e não me permitiram ter os meus pertences ou trocar de roupa durante 10 dias, ou me lavar; não conseguia distinguir o odor corporal.
Isso só agravou a minha já precária saúde porque tenho dificuldade em respirar, problemas cardíacos e alergias. Tinha comichão em diferentes partes do meu corpo. Todas as noites, eu sufocava e não conseguia encontrar alguém para me ajudar. Impediram-me de entrar em contato com o meu advogado. Proibiram-me de ter folhas e uma caneta para escrever às autoridades e organizações para intervir e me tirar desse pesadelo.
Anunciei que tinha iniciado uma greve de fome aberta no primeiro dia e ao longo dos 10 dias. Eu estava com fome e frio e, acima de tudo, não tinha notícias da minha família, que mora em El Aaiún, no Saara Ocidental. Não pude ver meu pai por sete anos, em violação da lei penal marroquina nº 93/28 sobre centros penitenciários e de todas as normas e convenções relacionadas aos direitos dos prisioneiros de proximidade a suas famílias.
Ao escrever este testemunho, não posso expressar tudo o que sinto e descrever o sofrimento real experimentado, tanto desprezo e atropelo à dignidade humana, a forma como fiquei confinado nesse lugar por 10 dias, especialmente num país que afirma ter percorrido um longo caminho no campo dos direitos humanos e busca encobrir a sua reputação no exterior.
Espero que com este testemunho a minha voz possa chegar a todas as organizações para intervir e exercer a pressão necessária sobre o Estado marroquino e pôr fim às suas flagrantes violações dos direitos humanos cometidas contra os prisioneiros políticos saaráuis.
Ahmed Sbaai, defensor dos direitos humanos e preso político saaráui, membro do Conselho de Coordenação da Associação Saaráui de Vítimas de Violações Sérias de Direitos Humanos Cometidas pelo Estado Marroquino e presidente da Liga pela Proteção dos Prisioneiros Saaráuis nas Prisões Marroquinas
Prisão Central de Kenitra
Número de prisioneiro: 29794
Tradução: Cebrapaz
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